terça-feira, junho 28, 2011

"A bebida mais forte"

Entra no café e pede a bebida mais forte! Nem sabia bem o que haveria de beber, mas queria começar o dia da pior maneira possível. A noite anterior, tinha-lhe trazido à memória velhas vivências, de tempos áureos que há muito se haviam esfumado.
Não queria mais pensar nela mas, sempre que achava que havia deixado o passado atrás das costas, um fantasma voltava para o assombrar. Já não sabia mais o que fazer, como haveria de se expiar. Já nada funcionava! A única maneira que encontrava de esquecer esse passado era esvaziando um copo, ou mesmo uma garrafa inteira.
Fazia tempo que não conseguia ter uma noite de sono. Sempre que fechava os olhos, os seus fantasmas saíam do escuro para o voltar a atormentar. Nem sequer conseguia pensar. Ela bloqueava-lhe as ideias, os pensamentos. De alguma maneira, tinha conseguido fazer com que ele não voltasse a ter paz. Tinha-o enfeitiçado.
Só durante o dia, o tempo que passava acordado lhe trazia alguma paz, algum conforto próprio.
Tinha alturas em que nem mesmo uma nova Musa inspiradora conseguia ter poderes suficientes para afugentar os fantasmas. Mas tinha de conseguir. Tinha de correr com esses fantasmas, com ou sem ajuda. Mas, quando parecia conseguir, algo sucedia. Sentia-se a perecer. As forças desapareciam e, como que por encantamento, sucumbia aos seus fantasmas apesar das vozes que ouvia a pedir que lutasse. Essas vozes, contudo iam-se tornando cada vez mais ténues, cada vez mais silenciosas, até que desapareciam no vácuo em que se tinham tornado as suas vivências. Só uma persistia. Só uma se fazia ouvir.
A voz Dela era tão ensurdecedora que fazia tremer a terra. No entanto, aos seus ouvidos, a Sua voz, nada se parecia com um som de tremor. Era uma voz tão calmante que faria morrer de inveja as Sereias de Ulisses.
Ainda assim, não era Ela a voz de uma mulher-demónio. Antes pelo contrário. Ela surgia no seu pensamento como, a Única capaz de apaziguar a sua alma, como sendo a única que se colocava do seu lado e enfrentavam juntos todos os seus demónios. E, no fim desta guerra titânica, Ela calava-se e deixava que o silêncio invadisse a sua vida.
Muito tempo ele demorou a perceber o porquê daquele silêncio. Mas acabou por entender que não eram os sons, os gritos ou os berros que feriam de morte as assombrações. Era sim, o silêncio ensurdecedor da indiferença. E foi quando ele entendeu isso que, se refugiou na sua fortaleza, que sonhou com Ela e, no seu sonho, se encontravam furtivamente, nos recantos da sua mente, não para se entregarem um ao outro, mas para ambos se entregarem ao silêncio das suas vidas. Somente para descobrir que por mais voltas que desse, afinal essa nova Musa era também um seu fantasma.
Ah! Mas como ele desejava esse Fantasma. Como ele gostava de A encontrar à noite, nos seus sonhos, para A olhar, para A ver, para Lhe tocar e sentir o suave da sua pele. Em algum sítio tinha lido que não deveria beijar com os olhos abertos no olhar da outra pessoa. Quem recebia o beijo, ao receber também o olhar tornava-se proprietária da alma de quem lhe surgia. Mas sempre, no seu sonho, ele sentia os lábios Dela nos seus e, de imediato ele abria os olhos. Queria entregar-se, render-se a esta Reia e dizer-lhe que ele Lhe pertencia. Era este o presente que Lhe entregava. Entregava-se a Ela, com a sua alma. Colocava-se a si nas mãos Dela.

Quando acordou, entrou no café e pediu a bebida mais forte.

5 comentários:

Anónimo disse...

soou-me a algum tipo de despedida, de algo ou de alguém...

(a menos que o texto seja completamente ficcionado, mas tenho as minhas dúvidas)

Venha de lá essa bebida.

Pedro Barros disse...

Despedida?! Talvez. Logo se vê...
Ficcionada ou não?! Nem eu sei bem. Já não me parece que consiga bem distinguir o sonho da realidade
Bebida?! Pede!

Anónimo disse...

...whatever.

Pedro Barros disse...

Credo...
Que frieza nesse "whatever"! :(

Pedro Barros disse...

A beber logo de manhã?!?!?!?