terça-feira, agosto 09, 2016

O show das marionetas

FOI há tanto tempo que nem me lembro quando. Mas há tanto tempo, quanto? Tempo? Podíamos ficar palavras, linhas e parágrafos a tentar decidir quando foi, ou mesmo como foi. Mas importa? E o que importa? Importas tu? Importo eu? Ou importamos nós? Que se passou?
No dia em que te vi, naquele dia, naquele segundo ou naquele instante de momento em que te vi, mas VI mesmo, foi o segundo que se tornou Tempo. A Terra parou, o vento deixou de abanar as árvores, os pássaros imobilizaram-se no ar, os ribeiros, riachos e rios congelaram e as marés dos mares e oceanos hibernaram. Fiquei só no mundo. Só eu me mexia e circulava entre as personagens de uma peça de marionetas cujo encenador deixou em posição estática, esquecido do espectáculo do movimento.
A estaticidade do mundo deu-me o que há muito ansiava. A solidão e o silêncio! Tive todo o tempo do Tempo para correr o mundo. Fui a todos os recantos escondidos onde desejei ir mas, todas as noites me deixava invadir por uma solidão maior que a que havia desejado. Essa solidão instaurou-se na minha pele e eu tornei-me impotente na minha condição de único andante num mundo imóvel. Podia dispor de tudo e só queria voltar ao ponto de partida.
Iniciei a viagem de regresso, sem saber o que fazer, o que esperar. E quando te voltar a ver... Quero dormir! Quero dormir sem te ter na cabeça. Ou então sim.. Quero dormir a ter-te na cabeça. Quero embalar-te no regaço e beijar-te a testa. Quero abraçar-te e sentir a nossa respiração a encontrar-se até sermos só um a respirar. Ou então sim.. Quero fugir para aquele ponto da vida, do mundo e do tempo em que não sei quem és, nem onde estás. As contradições instalam-se em mim à medida que me sinto a aproximarmos-nos. Mas de que adianta? A imobilidade do mundo e das marionetas adormecidas e esquecidas não me deixam ver-te. Mas que aconteceu? Onde estás? Como é possível? Tive de me afastar para que também tu ganhasses a energia do movimento? Como é possível já não estares no mesmo sítio em que te deixei? Só queria imobilizar-me na tua frente e esperar que o Tempo me fizesse criar raízes junto de ti. Se o mundo não mais mexesse, saberia que estaria no sítio onde sempre quis estar. Mas tu mexeste-te, ou mexeram-te. Onde estás? E porque não me vês ou ouves? Quero-te encontrar para.. Não!! Não te quero encontrar. Tenho medo de me ter esquecido de.. Mas já me esqueci. Não sei onde estás. Não te vejo.
Quero que o encenador acorde e mova as marionetas. Mas quero que as troque de lugar e crie uma nova história. Uma em que... Uma em que... Uma em que eu não exista senão na minha lembrança, em que eu não existe senão em tudo e todos em que toquei e em que deixei as minhas impressões. E todos terão a marca e olhando para ela, perguntarão "Quem?", e terão a sensação de lembrança de algo que nunca aconteceu.

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